por: Ivaldo Fernandes
No terreiro lá do sítio
Tem um bicho falador,
Com penacho levantado
E um andar encantador.
É o peru todo empolgado,
Se achando o imperador!
Anda firme, peito estufado,
Todo pomposo e vaidoso,
Solta gritos estridentes
Com um jeito orgulhoso.
Parece até coronel
Num desfile garboso.
Quando vê qualquer rival
Logo arma o seu teatrinho,
Abre asas, gira em volta,
E se exibe no cantinho.
Dá passinhos calculados
Feito dança de vizinho.
Ele engana a galinha
Com seu jeito de doutor,
Faz pose, canta e se curva
Como um grande sedutor.
Mas no fundo é só conversa,
Todo cheio de frescor.
É bicho esperto demais
Pra escapar do assador,
Na véspera do Natal
Sente logo o temor.
Se esconde, muda de canto,
Finge até ser beija-flor!
Faz de tudo no terreiro
Pra fingir que não é ave,
Anda até com os patinhos
Como quem quer ser mais grave.
Diz que é primo do pavão,
Só pra não virar suave!
Já fingiu até doença
Pra fugir do destino,
Fez gemido, tossiu alto,
Disfarçou com ar menino.
Enganou até o dono
Com um plano cristalino!
Certa vez se fez de morto
Quando viu faca na mão,
Ficou duro feito pedra
Estatelado no chão.
Mas abriu um só olhinho
Pra vigiar o patrão.
Outra vez fugiu da cerca
Com um pulo magistral,
Se enfiou dentro do mato
Feito bicho sem igual.
Disfarçou com folhas secas,
Se livrou do funeral!
Diz a lenda que esse bicho
Já estudou camuflagem,
Sabe onde é que se esconde
Mesmo em plena estiagem.
E quando a ceia se apronta,
Ele some na paisagem.
É um mestre da enganação,
Tem diploma de artista,
Já posou de galo velho,
De coruja e de corista.
Só não gosta de confessar
Que é peru na sua lista.
Seu papo vermelho brilha
Como luz de lampião,
Serve de alarme esperto
Em caso de confusão.
Basta o som de um estalo
Pra fazer alvoroço e ação.
Na hora de comer milho
Vira logo um glutão,
Mas se ouve um barulhinho
Sai voando feito avião.
É valente até que ouve
Um talher no batistão.
Já tentou trocar seu nome,
Fez campanha eleitoral,
Se dizendo “Ave Real”
No programa nacional.
Mas ninguém deu importância,
Chamaram-no de banal.
Certa vez virou manchete
Num jornal da região:
“Peru Mestre da Fuga
Vira herói do sertão!”
Enganou três cozinheiros
E o chefe do galpão.
Se vestir é seu talento
Pra não ser reconhecido.
Já usou até batina
Pra fingir ser convertido.
Disse que virou pastor
E o destino foi contido!
Ele canta igual sanfona
Num forró bem animado,
Faz o “gluglu” compassado
Todo dia ensaiado.
Só não canta quando vê
O forno pré-aquecido e armado.
Tem o bico afiado e curto
Pra beliscar sem doer,
Mas se o milho for pequeno,
Sabe como resolver.
Dá um golpe certeiro e rápido
Pra não ter que se mover.
Com as asas ele voa
Só uns metros do chão,
Mas se o perigo aparece
Vira logo um furacão!
Bate tudo em desespero
Feito um raio em explosão.
Os pintinhos já aprendem
Com o mestre peru velho:
“Fingimento é que salva
No dia do escarcéu!”
E crescem todos espertos
Com diploma no anel.
Até o pato tem respeito
Pelo seu jeito matreiro,
Já o galo sente inveja
Desse bicho altaneiro.
Pois com toda aquela pose,
É o ator do galinheiro!
Faz discurso na alvorada
Como quem quer governar,
Se escutasse a votação
Talvez fosse se eleger.
Só perde pro frango assado
No sabor do paladar!
Ele reza, faz promessa,
Diz que é bicho de oração,
Se pendura em Santo Antônio
E até em São Sebastião.
Tudo isso pra escapar
Do destino de assação.
Mas no fundo é camarada,
Bicho manso e engraçado,
Traz cultura no terreiro
Com seu passo compassado.
Só não gosta de conversa
Com tempero do lado.
Esse é o nosso peru,
Astuto e cheio de manha,
Enganando até a morte
Com sua mente tamanha.
E no cordel foi contado
Com rima boa e estranha!
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